terça-feira, 17 de março de 2009

Sentença: "Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS, com fulcro no art. 269, I, do CPC"

Segue, abaixo, a sentença da primeira instância na qual o Dr. Joaquim Ribeiro Filho é absolvido das acusações que foram insinuadas no caso do transplante de Jaime Ariston.
Ver, ainda:
A procuradora e o Hospital Geral de Bonsucesso
Perguntas ao Procurador
São Paulo e a Câmara Técnica
Algumas perguntas

2003.51.01.023256-3 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA/IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Autuado em 13/10/2003 - Consulta Realizada em 17/03/2009 às 14:25

AUTOR : MINISTERIO PUBLICO FEDERAL E OUTRO

PROCURADOR: MONICA CAMPOS DE RE E OUTRO

REU : JOAQUIM RIBEIRO FILHO

ADVOGADO : GILBERTO FRAGA E OUTRO

21ª Vara Federal do Rio de Janeiro - MARIA ALICE PAIM LYARD

Juiz - Sentença: LILEA PIRES DE MEDEIROS



Objetos: SERVIDOR PUBLICO: PERDA DA FUNCÃO PÚBLICA

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Concluso ao Juiz(a) LILEA PIRES DE MEDEIROS em 06/03/2009 para Sentença SEM LIMINAR por JRJRRE

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SENTENÇA TIPO: A - FUNDAMENTAÇÃO INDIVIDUALIZADA LIVRO REGISTRO NR. 000163/2009 FOLHA



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JUSTIÇA FEDERAL

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO DE JANEIRO

21ª VARA FEDERAL



SENTENÇA TIPO A

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ajuíza a presente ação civil pública, por ato de improbidade administrativa, em face de JOAQUIM RIBEIRO FILHO objetivando a condenação do réu à perda de sua função pública de médico e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, à suspensão de seus direitos políticos por cinco anos, ao pagamento de multa civil de cem vezes o valor da remuneração por ele recebida enquanto servidor e à proibição de contratar com o Poder Público e receber benefícios e incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, tudo na forma do artigo 12, III da Lei 8.492/92. Liminarmente, pugna pelo seu afastamento do cargo de Cooordenador do Rio Transplante.

Como causa de pedir a prestação jurisdicional, narra que o Rio Transplante foi reorganizado para atender às determinações contidas na Lei 9.434/97, sendo certo que um dos objetivos fixados foi o gerenciamento do Banco de Órgãos e Tecidos Humanos do Estado do Rio de Janeiro com a consequente orientação de extração, conservação e distribuição, bem como a manutenção de uma relação única de pacientes potenciais receptores, com observância do critério cronológico. Não obstante, afirma o autor que o Rio Transplantes nunca funcionou adequadamente.

Prossegue afirmando que a nomeação do réu para o cargo de Coordenador do Rio Transplante visou a atender interesse pessoal, na medida em que, dois dias após ter assumido sua função, o mesmo praticou atos que possibilitaram a burla da ordem cronológica da lista única de transplantes de fígado com a transplantação do paciente J.A.A.S., irmão do então Secretário de Estado de Transportes, constante como número 32 do grupo sanguíneo O.

A Procuradoria da República encaminhou, então, ao Coordenador do Rio Transplantes ofício solicitando esclarecimentos acerca do ocorrido, entretanto o réu não logrou esclarecer, nem comprovar documentalmente, a impossibilidade clínica dos pacientes listados do número 01 ao 31 para serem preteridos em sua posição cronológica.

Aduz, ainda, que foi contatado por membros da Equipe de Transplante do Hospital Geral de Bonsucesso - HGB na tentativa de evitar arbitrariedades cometidas pelo réu no que concerne ao impedimento da captação tanto do fígado quanto do rim doado pela família da paciente M.N.O.S., internada naquele nosocômio. Sustenta, pois, que o fígado em questão deveria ser encaminhado aos pacientes em primeiro e segundo lugar do grupo sanguíneo ¿B¿. Entretanto, contrariamente à argumentação dos médicos do HGB, foi determinado que se perfundisse o órgão com solução de Collins, o que o tornou imprestável para o transplante. Diante de tal fato, o Ministério Público requereu a realização de biópsia, a qual constatou que o fígado, cuja retirada para transplante foi impedida, era normal.

Inicial instruída com os documentos de fls. 37/545.

O réu se manifestou às fls. 556/615 aduzindo que a presente ação tem cunho persecutório, sendo certo que a controvérsia posta na lide tem origem em desavenças com os atuais integrantes da equipe de transplante de fígado do HGB. Sustentou, ainda, a inadequação da via eleita, bem como a ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal. Alegou que a inicial não está instruída com documentos hábeis a comprovar a existência de ato de improbidade administrativa, bem como que a mesma é inepta no tocante ao pedido de perda da função pública de médico e professor.

Aduziu, ainda, que os atos apontados como de improbidade administrativa teriam sido praticados na condição de Coordenador do Programa Rio Transplante, no exercício da função pública estadual. Deste modo, não poderia surtir qualquer efeito jurídico de perda de cargo de médico e professor da UFRJ, função pública federal.

Sustentou que o critério cronológico da fila de transplantes de fígado não é absoluto e nem o único a determinar a identificação do paciente a receber o órgão, sendo de absoluta importância a avaliação das condições clínicas tanto do doador como do receptor. No que pertine ao fígado que deixou de ser transplantado, afirmou que o mesmo era impróprio para tal fim e que o procedimento adotado no sentido de se perfundir o órgão com a Solução de Collins foi correto. Juntou os documentos de fls. 617/925.

O Ministério Público juntou às fls. 929/947 os principais depoimentos colhidos na Sindicância do CREMERJ, bem como os documentos de fls. 949/1015.

Decisão de fls. 1016/1019 rejeitando as preliminares aduzidas, recebendo a petição inicial e indeferindo o pedido liminar. Em face de tal decisão, o Ministério Público noticiou a interposição de recurso de agravo de instrumento (fl. 1021). Embargos de Declaração opostos pelo réu às fls. 1039/1047, contra-razões às fls. 1156/1165. Decisão de fls. 1263/1264 conhecendo dos embargos e negando-lhes provimento. Noticiada pela parte ré a interposição de agravo de instrumento à fl. 1302.
Contestação às fls. 1268/1301.
O Ministério Público juntou aos autos, às fls. 1354/1466, relatório de auditoria realizado pelo DENASUS (Departamento Nacional de Auditoria do SUS).

Decisão de fl. 1502 negando provimento ao agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público.
Réplica às fls. 1576/1586.

Requereu o réu a produção de prova pericial e documental suplementar (fls. 1589/1591) e o autor, a produção de prova testemunhal e pericial.

Instado a se pronunciar, o Estado do Rio de Janeiro manifestou-se à fl. 1602 informando que nada tem a pleitear. A União requereu o seu ingresso no feito na qualidade de litisconsorte do Ministério Público Federal. Não manifestou interesse na produção de provas (fl. 1791).

Antes de ser deferida a produção de prova pericial, foram expedidos ofícios ao Hospital Geral de Bonsucesso e ao Hospital Universitário Clementino Fraga Filho a fim de prestarem informações acerca da existência e das condições de análise das amostras preservadas dos órgãos em comento, entretanto referidos nosocômios ainda não atenderam à determinação judicial.
É o relatório.

II
Inicialmente, reconsidero a produção da prova pericial anteriormente deferida, bem como indefiro as demais, por entender que os elementos carreados aos autos são suficientes ao deslinde do presente feito, conforme se passará a expor.

Sustenta o Ministério Público Federal que, ao assumir a Coordenação do Rio Transplantes em julho de 2003, o réu praticou atos que possibilitaram a burla da ordem cronológica da lista única de transplantes de fígado, favorecendo a transplantação do paciente constante como número 32, irmão do então Secretário de Estado de Transportes.

Em sua defesa, narra o demandado que o critério cronológico não é absoluto e nem o único que deve ser avaliado para a realização dos transplantes, que devem ser observadas, no momento da coleta, eventuais alterações no órgão que o caracterizem como enxerto limítrofe (enxerto marginal), ou seja, que possa apresentar risco de vida ao paciente que vier a recebê-lo, tais como borda romba, esteatose hepática, coloração alterada, consistência endurecida, presença de infecções ou tumores, dentre outras.

Ora, sendo certo que a probidade administrativa é o dever de o servidor servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer, a questão trazida aos presentes autos cinge-se em verificar a retidão dos procedimentos adotados pelo réu, pelo que a fundamentação do julgado terá como base os pareceres, relatórios e demais documentos técnicos acostados aos autos.

No que concerne à estrita observância da fila única de espera, tornou-se incontestável que a transplantação não deve ater-se somente à ordem cronológica, cabendo ser apreciados, dentre outros, critérios como compatibilidade sanguínea e peso corporal.


Outrossim, se houver constatação de órgão marginal durante a cirurgia de retirada, o mesmo deve permanecer com a equipe que está realizando a captação para que o enxerto seja implantado em receptor marginal, sendo importante esclarecer que tal determinação tem por objetivo evitar a perda do órgão, ante o limite temporal em que o órgão sobrevive sem a circulação sanguínea. Deste modo, em caso de doador marginal, o fígado é destinado ao primeiro paciente que aceite o risco.

Afigura-se, in casu, a situação em comento. Com efeito, o fígado doado ao paciente de número 32 da fila apresentava borda romba, aspecto macroscópico que o torna enxerto marginal.

Neste sentido, insta salientar ainda que o réu logrou demonstrar com as declarações dos pacientes acostadas às fls. 851, 860, 866, 869, 872, 879, 894, 897, 900, 903 que os mesmos não eram candidatos à transplantação de fígado marginal.

Ressalte-se que, não obstante as assertivas constantes do relatório da auditoria do DENASUS de que não há legislação específica sobre a utilização de fígado marginal, o fato é que o que está sendo tutelado no caso em questão é a própria vida do paciente, significa dizer, pois, o mais fundamental de todos os direitos consagrados pela nossa Constituição Federal. Ademais, o uso de fígado marginal constituiria uma alternativa, senão a única, válida para um receptor em estado grave.

Corroborando tal posicionamento, transcrevo o voto proferido pelo i. Relator do processo ético-profissional instaurado junto ao Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro:

"A análise dos autos demonstra que o cume da questão ética é se houve ou não ultrapassagem indevida na fila dos candidatos à transplante, por influência política, por parte do denunciado.

O paciente Jayme Ariston já estava inscrito desde 2002 e ocupava a 32ª posição na fila. Encontrava-se com o estado geral agravado, comprovado tanto pelo médico assistente quanto pela análise do prontuário.

Ora, caso o denunciado resolvesse favorecer o paciente de alguma maneira, teria realizado o transplante em data anterior, já que dispunha de condições para realizá-lo, bem como faria o transplante pessoalmente.

Quanto à qualidade do enxerto, acompanhamos a opinião da testemunha arrolada, Dr. Luis Augusto Carneiro D'Albuquerque, que a ordem cronológica pode deixar de ser aplicada em situações especiais. Bordas rombas e tempo de isquemia são fatores importantes, bastando uma das características estar presente para o órgão ser considerado marginal. Em relação ao valor da biópsia, acompanho a opinião do mesmo médico.

(...)

O denunciado tem um currículo invejável e trabalha em instituições públicas, sendo professor de conceituada universidade, de tal maneira que sou de opinião que serve de exemplo para a categoria.

O artigo 17 se refere a condições mínimas para o desempenho ético da Medicina, função que cabe aos diretores das unidades onde são realizados os transplantes e não ao Coordenador do Rio Transplante, instituição burocrática. Assim sendo, também o absolvo neste artigo.

O artigo 43, somente um patologista muito experiente em transplantes pode fazer a interpretação correta, assim sendo absolvo o denunciado também no artigo 43.

O artigo 116 trata de boletim falso ou tendencioso, não encontramos nos prontuários analisados qualquer boletim assinado pelo denunciado, faltando a prova material para qualquer condenação. Absolvo-o também neste artigo."


De igual modo, reproduzo o voto do i. Conselheiro-Revisor:

"O paciente era assistido pelo médico Henrique Sérgio Moraes Coelho há cerca de oito anos por ser portador de doença hepática, tendo sido encaminhado para o Rio Transplante e que cerca de quatro meses antes de ter sido transplantado teve importante piora do seu estado geral sendo informado ao paciente da necessidade urgente do transplante e da possibilidade de receber um fígado marginal.

(...)

Os critérios para que um paciente se beneficie de um transplante hepático não são rígidos e, como toda a prática de medicina, são flexíveis. Na análise dos autos e durante este julgamento ficou evidente que o Sr. Jayme Aristom Sobrinho recebeu um fígado classificado como marginal pela urgência do seu quadro, preenchendo outros critérios e não apenas o cronológico.

Pelos dados contidos neste processo, pela conduta ilibada e pelo magnífico trabalho do denunciado frente ao Rio Transplante, considero que o médico Joaquim Ribeiro Filho não infringiu nenhum dos artigos do Código de Ética Médica dos quais é acusado, considerando-o inocente e absolvendo-o".


Por outro giro, o Ministério Público assevera em sua exordial que fora contatado por membros da Equipe de Transplante de Fígado do Hospital Geral de Bonsucesso HGB na tentativa de serem evitadas arbitrariedades cometidas pelo réu, as quais consistiam no impedimento da captação do fígado doado pela paciente M.N.O.S, internada naquele hospital.

Para tanto, fundamenta sua assertiva aduzindo que o réu, baseado em observação relatada pela Dra. Inary Bueres, alegou que o fígado em questão apresentava esteatose. Por conseguinte, determinou que o órgão fosse perfundido com Solução de Collins, o que o tornou inaproveitável para uso em transplante.

Ao seu turno, sustentou a parte ré que o fígado não foi captado diante da presença de esteatose hepática, múltiplas lesões microcísticas em doador portador de meningioma. Foi realizada perfusão com 2 litros de Collins, sendo então evidenciada intensificação da esteatose, atingindo grau de 50 a 70%, portanto, inviável para transplante.

Ora, numa simples pesquisa acerca das indicações de uso da Solução de Collins, depreende-se que é uma solução que pode ser utilizada para fluxo hipotérmico e acondicionamento de órgãos incluindo rins, fígado e pâncreas para transporte e preservação antes do transplante.

Outrossim, o que se verifica no caso em questão é que a decisão do réu no sentido de descartar o fígado teve por base relatório proferido pela médica responsável pela captação do órgão, pelo que não pode ser a ele imputada tal responsabilidade.

Com efeito, é forçoso reconhecer a relevância da opinião do profissional captador, eis que em determinados casos o resultado da anatomia patológica pode não corresponder à situação do órgão como um todo, uma vez que analisado tão-somente um determinado fragmento.

Deste modo, não merecem prosperar as alegações autorais, pelo que resta concluir pela improcedência de seu pedido.


III

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS, com fulcro no art. 269, I, do CPC.

Sem custas e sem honorários.

Com o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquivem-se.

Rio de Janeiro, 05 de março de 2009.

LILEA PIRES DE MEDEIROS

Juíza Federal Substituta


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Publicado no D.O.E. de 10/03/2009, pág. 26 (JRJRRE).

 Ver: Dr. Joaquim Ribeiro Filho - absolvido em 2ª instância por unanimidade
(prestem atenção nas observações da defesa a respeito do modo como o processo foi conduzido)

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