Liminar para furar fila valia só em PE, diz juiz
Decisão foi usada pelo médico Joaquim Ribeiro Filho para justificar prioridade dada a um paciente da fila de transplantes no Rio
Defesa do médico discorda e diz que foram encaminhados ofícios comunicando a decisão para várias centrais de transplante do país
DENISE MENCHEN
DA SUCURSAL DO RIO
A decisão judicial que o médico Joaquim Ribeiro Filho diz ter cumprido ao priorizar o paciente Carlos Augusto Arraes de Alencar na fila de transplantes de fígado era válida apenas para Pernambuco, segundo um desembargador e o Ministério da Saúde. A defesa do médico discorda. Arraes foi operado no Rio, em 18 de julho de 2007.
A Folha teve acesso à decisão. Alencar sofria de hepatite C e tinha um tumor cancerígeno. No texto, o desembargador substituto da 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Francisco Oliveira, determina à Central de Transplantes local que dê prioridade ao paciente. Para acatar o pedido, negado na primeira instância, diz ter considerado laudo de Ribeiro Filho sobre a necessidade do transplante.
"Em face de todo o exposto, concedo a antecipação de tutela requerida, para determinar ao Estado de Pernambuco, na pessoa do coordenador de transplantes do Estado, que proceda a todos os atos necessários à classificação do caso do agravante [Arraes] como de urgência máxima, realizando o imediato transplante de fígado", escreveu Oliveira. A Folha não o localizou. O TJ diz que ele está em férias.
Para o relator titular da 7ª Câmara Cível, desembargador Luiz Carlos Figueiredo, não há dúvidas. "O juiz de plantão foi claro. Determinou que o autor, pela gravidade da doença, deveria ser passado à frente da fila em Pernambuco. Daí a dizer que isso vale para os órgãos executivos de outros Estados há uma distância abissal."
O advogado e irmão do médico, Paulo Freitas Ribeiro, discordou. Ele admitiu que a liminar cita apenas Pernambuco, mas disse que foram encaminhados ofícios comunicando a decisão a centrais de transplante de todo o país, inclusive para a do Rio. "Se o ofício é dirigido a todas as coordenações e a lista é nacional, então a nossa interpretação é que há priorização na lista nacional." O advogado de Arraes, Valnê Xavier, fez a mesma avaliação.
Na ação, Arraes havia solicitado a inclusão dos Estados notificados (RJ, MG, SP, RN, PR, PB e DF) e da Central Nacional de Transplantes como co-réus, para que a prioridade na fila fosse concedida em todas as centrais onde o paciente estava inscrito à espera de um fígado. O pedido, porém, foi ignorado na liminar de 14 de julho e rejeitado definitivamente em 4 de janeiro, após a operação.
Para o ministério, a inscrição de Arraes em mais de um Estado já constitui irregularidade. O diretor-geral do departamento de Atenção Especializada, Alberto Beltrame, afirma que cada Estado é responsável por sua própria lista. "A lista nacional é apenas um somatório dessas listas estaduais."
O advogado do médico defende, porém, que a legalidade do transplante realizado independe da liminar. "A própria legislação fala que a ordem cronológica é excepcionada se, por questões de logística, o órgão não puder ser implantado nas pessoas que estão nos primeiros lugares da fila."
São Paulo, quarta-feira, 27 de agosto de 2008
Cotidiano - Folha de S.Paulo
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