Entretanto, forçoso é reconhecer a emissão, por parte da ré, de juízo de valor e sensacionalismo, na publicação da foto do autor, por ocasião de sua prisão, sob o título ´O cirurgião fura-fila´. A liberdade de expressão, o dever de informação e o interesse público da matéria publicada não justificam a exposição da imagem do autor em momento tão constrangedor e em situação humilhante de sua vida, assim como também não se justifica sua denominação como ´O cirurgião fura-fila´. Tais elementos são absolutamente dispensáveis e nada acrescentam à matéria veiculada em termos de informação útil à sociedade, extrapolando o direito à liberdade de expressão.
No caso em análise, porém, a ré não agiu nos limites do exercício regular do direito de liberdade de imprensa. Dessa forma, cometeu o ilícito e, assim, tem dever de indenizar o dano moral causado ao autor. (...) A utilização de expressões ofensivas, debochadas e desnecessárias ao relato, excedem os limites narrativos necessários à difusão de um fato, atribuindo-lhe caráter sensacionalista, impróprio à situação real e aos sentimentos das pessoas envolvidas. Na fixação do quantum indenizatório, devem ser levados em consideração a capacidade econômica das partes, o dano causado à vida profissional e pessoal do autor, o caráter pedagógico-puni tivo de tal espécie de indenização, bem como que a indenização arbitrada não pode ser insignificante para o causador do dano ou constituir enriquecimento sem causa para a vítima. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO ...
Vale a pena relembrar o que foi feito pela Revista Época:
Em nome da liberdade de imprensa, a chamada "Operação Fura-Fila" vira "O Cirurgião Fura-Fila" com direito a foto do médico e tudo.
Ou seja, a postura ética da Revista Época não se incomoda em transformar (com uma simplicidade criminosa) um médico investigado em condenado. E não vamos entrar no mérito sobre o modo e o propósito com que essa investigação foi conduzida. Para isso, basta dar uma olhada na manifestação da defesa no TRF 2ª Região.
Mas, ao ler a matéria tudo fica claro. Três casos dolorosos relacionados ao transplante são usados como exemplo para mostrar como um médico pode se aproveitar do sofrimento dos pacientes. Um dos casos é o de Rafael Paim:
Mais do que a falta de doadores, para Rafael, o maior problema do transplante no Brasil é a ausência de estrutura e a agilidade no sistema de saúde para a notificação de que há um órgão disponível. “Os hospitais não têm estrutura e os médicos acabam gastando muito tempo para checar todos os exames necessários. Eles acabam indo embora e a doação se perde”, diz. “O maior problema desse país é a falta de ação”. Rafael teme que operação da Polícia Federal prejudique ainda mais esse cenário ao deixar os doadores e os médicos receosos com o processo de transplante. “Esses casos são pontuais, há muita gente na lista esperando pelo transplante. Se isso acontecer, serão mais vidas perdidas”.
O que faltou dizer na reportagem é que o Dr. Joaquim Ribeiro Filho fez de tudo para salvar o filho de Rafael Paim. O caso do bebê Arthur saiu até no Fantástico.
O Dr. Joaquim tomou uma decisão bastante ousada para a época, seguindo o Conselho Federal de Medicina. Hoje, ela é aceita pelo Supremo Tribunal Federal, mas, na época, além de corajosa, era bastante polêmica.
Como a Revista Época interpreta esse gesto? Típico de um "médico fura-fila"? Por que o médico não é citado em um caso em que atuou com determinação para salvar o paciente? Os jornalistas não apuram as informações que conseguem? A manchete seria diferente nesse caso?
A pergunta que podemos fazer, na verdade, é: haveria uma "reportagem" nesse caso?
Vejam a reportagem do Fantástico de 11/12/2005("O bebê Arthur") e avaliem o papel do médico naquele caso. Vejam se ele mereceu o tratamento dispensado pela liberdade de imprensa tal como ela é concebida pela Revista Época. Preso, sem ter sido ouvido, nem lhe foi concedido o benefício da dúvida, levando em conta o seu passado profissional.
Tentem entender, também, por que médicos com este perfil (veja "quando não são perseguidos, são ignorados") sofrem com ações constantes do Ministério Público, enquanto o mesmo procedimento não é adotado com outras figuras públicas do Estado do Rio de Janeiro. A Revista Época e os demais veículos de comunicação poderiam usar a liberdade de imprensa para nos explicar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário