CARTA ABERTA
O CASO DO DR JOAQUIM RIBEIRO FILHO:
O QUE A OPINIÃO PÚBLICA PRECISA SABER
Antes de condenar publicamente os cidadãos é preciso prudência e ponderação. O Ministério Público, a Polícia Federal e a Imprensa são órgãos fundamentais para o aperfeiçoamento do processo democrático, e por isso mesmo não podem permitir que alguns de seus setores extrapolem o que é próprio de suas missões, espetacularizando, difamando, condenando a priori e, pior, confundindo a opinião pública. O discurso de mão única calcado num texto que induz a uma única verdade afirmada e reiterada num tom que faria tremer os maiores inquisidores medievais retira dos cidadãos a possibilidade de refletir com serenidade, de pensar com calma, de avaliar a partir de conjuntos maiores e necessários de informações que precisam ser reveladas.
Os atos impetrados contra o Dr Joaquim Ribeiro Filho na chamada “operação fura-fila” (qualificativo por si só já condenatório e pejorativo) correspondem a atos da maior gravidade, diríamos mesmo de irresponsabilidade. O Dr Joaquim Ribeiro Filho é um dos médicos e cirurgiões mais importantes do país. Tem no seu currículo a implantação do sistema de transplantes de fígado no Brasil, após passar grande período especializando-se nos melhores centros de transplante da França. Dedica-se há várias décadas a construir algo que não existia até então e que tem salvado milhares de vidas. É incansável no atendimento a dezenas de pacientes de todas as classes sociais que diariamente chegam até ele e sua equipe. Trabalha como professor no Hospital Clementino Fraga no Fundão por absoluta vocação, militância e consciência do dever com a causa pública de docente e de médico. É apaixonado pelo que faz. É combativo e determinado quando o assunto é salvar vidas. Efetivamente não se deixa dobrar pelas burocracias ou pelos podres poderes em busca de cargos e privilégios. Foi convidado em várias ocasiões para deixar o país e integrar equipes no exterior por sua competência e extrema habilidade enquanto cirurgião, mas sempre recusou estes convites por acreditar no Brasil, por acreditar que aqui poderia implantar um serviço de medicina de ponta, novo e de primeiro mundo. Mas, ao que parece certos setores do Brasil não querem chegar ao primeiro mundo. Preferem a mediocridade, a burocracia, a insensibilidade, os enredos tragicômicos das acusações espúrias, forjadas e descabidas, permitindo que a honra dos cidadãos sejam manchadas. Até quando? Até quando continuaremos a lançar na fogueira da inquisição aqueles a quem deveríamos estar reverenciando, admirando e seguindo como exemplo de dignidade, de trabalho, de dedicação a ideais humanitários.
Conhecemos o Dr Joaquim. Temos o grande privilégio de desfrutar de sua amizade. Acompanhamos há muitos anos seu esforço em construir passo a passo, com as maiores dificuldades, o sonho de um serviço de transplante de fígados com dignidade no Hospital Universitário Clementino Fraga que se tornasse um modelo para todo o Brasil. Sabemos que ele é capaz de fazer o impossível quando a questão é salvar vidas.
É uma pena que estejamos todos sendo destruídos pelo grande circo midiático e queimando vivo um dos maiores talentos da medicina brasileira. Aqueles que conhecem sua família e sua formação desde os tempos do Colégio Santo Inácio e da sua passagem pela Faculdade Medicina da UFRJ, sabem que ele foi criado dentro dos valores cristãos e de defesa dos ideais humanitários. Sabem também que o caso pontual no qual o Dr Joaquim está sendo alvo de denúncias corresponde a uma má interpretação de fatos ocorridos que levaram a que Dr Joaquim viesse a salvar a vida de Carlos Augusto de Alencar Arraes.
Vamos aos fatos: em meados de julho de 2007, as equipes de transplante de Minas Gerais informaram ao Serviço Nacional de Transplantes em Brasília que havia um órgão disponível em Belo Horizonte, pois devido à greve da UFMG não havia condições de captação do mesmo. A opção de captação do órgão foi então encaminhada para possíveis receptores no Rio de Janeiro. Entretanto, um fato novo prejudicaria a captação do órgão pelas equipes do Rio de Janeiro (Hospital Geral de Bonsucesso e Hospital Clementino Fraga da UFRJ, este último coordenado pelo Dr Joaquim). Havia acabado de ocorrer um acidente com um avião da TAM em São Paulo e, por este motivo, o SNT avisou que não haveria transporte para levar o órgão. Entrávamos em plena crise aérea com várias suspensões de vôos e caos nos aeroportos. Dr Joaquim informou ao SNT em Brasília que havia um paciente seu particular internado na Clínica São Vicente que teria condições de alugar um jato particular e consultou se isso seria possível para que o órgão não fosse descartado, ou seja que ele não fosse jogado no lixo e pudesse servir para salvar uma vida. É preciso que fique claro que estes órgãos tem uma vida útil de curta duração e que a captação tem que ser muito rápida, sendo que em muitos casos é preciso aproveitar oportunidades únicas envolvendo doador, órgão e paciente em condições de cirurgia. A família do Sr Carlos Augusto Arraes se mobilizou e obteve determinação judicial do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco autorizando a captação do órgão e a realização da cirurgia. Todo este processo está documentado no setor de transplantes de Minas Gerais. O procedimento cirúrgico foi realizado com sucesso na Clínica São Vicente e num encaminhamento absolutamente normal, a família do paciente pagou ao Dr Joaquim, à sua equipe e à Clínica São Vicente os honorários devidos, o que no total consistiu em aproximadamente R$ 90.000,00, cifra inquestionável para este tipo de intervenção cirúrgica numa das clínicas mais conceituadas e também de custos mais elevados do Rio de Janeiro. No final de julho, a Coordenação de Transplantes do Rio de Janeiro e o então Secretario Estadual de Saúde Sergio Cortes, em função de desavenças políticas com o Dr Joaquim, fizeram denúncias ao Ministério Público de que o Dr Joaquim teria saído do Rio de Janeiro para Belo Horizonte com um ofício para buscar o órgão para o Hospital Universitário e que no caminho teria desviado o órgão para seu paciente na Clínica São Vicente. O Ministério Público Federal iniciou então as investigações. Dr Joaquim solicitou que fossem incluídas no processo as informações da Asssociação Nacional da Aviação Civil – ANAC – sobre planos e notas de vôos daquele dia para comprovar a falta de fundamento da acusação. Seguiram-se outros fatos e provas a favor do Dr Joaquim que tramitam na justiça. Pois, se existem denúncias, se existem processos é preciso assegurar o que reza na Constituição: o direito legítimo de que os “suspeitos” se defendam publicamente no fórum adequado do poder judiciário.
Queremos ainda chamar a atenção para alguns pontos que não estão sendo contemplados e que ajudariam a esclarecer a opinião pública a não embarcar neste ato de vandalismo e violência que consiste em trucidar um grande médico e cidadão brasileiro. Cabe indagar: A quem serve queimar o Dr Joaquim em fogueira pública? Qual o debate que efetivamente interessa à população brasileira sobre o tema dos transplantes? Que política de saúde queremos para o país?
Certamente não queremos compactuar com a visão estreita e burocrática. O tema dos transplantes é delicado e cheio de nuances. Temos que aprender a ouvir aqueles que efetivamente entendem do assunto e o Dr Joaquim é a maior eminência neste tema. Os seres humanos são singularidades delicadas e a visão da fila nestes casos não pode ser equivalente à visão da fila de um banco. Não somos cartões de crédito, cédulas bancárias, talões de cheque. Somos seres com alta complexidade. Transplantar um órgão não é o mesmo que montar um robô. Um órgão pode ser compatível com uma pessoa e não com outra por inúmeras razões, idade, tamanho, estado, enfim, razões que somente os médicos sabem apontar. Para isso eles estudam anos a fios e se dedicam à profissão. Seria muito bom se todos pudessem ser atendidos e contemplados. Mas, e o desperdício de órgãos? Os setores da saúde não deveriam fazer o possível para aproveitar os órgãos passíveis de transplante? E quando, por motivo de ineficiência da máquina estatal, um órgão não pode ser aproveitado para os transplantes no âmbito público? Deve ser jogado na lata do lixo? Não deveríamos juntar nossas forças e energias para campanhas de melhoria das condições dos hospitais públicos, especialmente os hospitais universitários, o que vem sendo motivo freqüente de reivindicação dos abnegados médicos que ainda defendem e trabalham pela saúde pública como o Dr Joaquim?
Adotando a prática da serenidade, precisamos olhar com mais respeito para a trajetória dos cidadãos, antes de nos deixarmos ser confundidos pela destrutividade de espetáculos midiáticos que de uma tacada reduzem a pó trajetórias lenta e pacientemente construídas que deveriam, como é o caso da trajetória do Dr Joaquim, nos encher de orgulho.
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